Perder um filho é perder um pedaço de nós...
perder dois filhos é uma dor que não desejo a ninguém.
Sobreviver à perda, talvez seja mais um aprendizado que advém de tudo isto...
Dias em que um furacão passou pela minha vida...
Dia 3/5 a 13/5 : fui internada na U.T.I. do hospital São Lucas em Santos
Razão: eclâmpsia, interrompendo assim uma gestação gemelar no 6º mês
Era uma realização de um sonho de anos... Anos em que sentia uma enorme
saudade de alguém que não conhecia, mas que já amava.
Esse amor era tão grande que multiplicou-se em dois.
Quando dava a notícia as pessoas sobre a gravidez, sempre dizia:
--Pedi um filho ao Papai do Céu, mas Ele me deu dois!!-isso sempre foi um grande orgulho para mim.
Sabia que não seria fácil.
Durante a gravidez, fui preparada pelo
médico: a pressão alta já seria um agravante, mesmo assim eu queria tentar ter um filho.
Tudo foi munuciosamente calculado. E então após um ano , conseguimos:
Ainda me lembro da expressão de desânimo do médico quando contamos a ele que seriam gêmeos...Remédios, dietas que me matavam de fome, afastamento do trabalho e muita calma não foram o bastante.
O mais estranho era quando pessoas que perderam seus filhos gêmeos me procuravam para contar sua dor. Às vezes batia um medo, pois pareciam estar me preparando para alguma coisa.
Lembro também de quando contei a um professor da faculdade que eu seria mãe de gêmeos.Ele disse: --Meus pêsames, ou será que deveria te dizer meus parabéns...
Sinceramente, isso não é uma coisa que uma grávida gostaria de ouvir. Mas o que é felicidade para uns, às vezes não é para outros.
Dia 5/5, é chegado o dia , minha pressão não abaixava e meus anjinhos teriam que nascer antes. Após o parto, fomos separados: eles para a UTI neo natal, eu na UTI , onde fiquei alguns dias dopada de remédios e sem poder conhecê-los. Perdi a noção do tempo, usei fraldas, sondas, aparelhos ligados em mim...tinha os braços roxos por conta das agulhas, os pontos da cesária doiam muito e apesar de todo carinho e atenção que lá recebia da equipe de enfermagem, minha "estadia" , mais parecia com a sensação de estar enterrada viva.
Víctor p
ermaneceu internado na UTI neo natal, demosntrando uma força enorme de vida. Víctor usava touquinhas para não perder calor, era moreninho, tinha cílios compridos, era fofo, uma miniatura de bebê...
Seus rins não estávam prontos para a vida aqui fora e por isso não podia ser amamentado pela sonda, assim como seu irmãozinho Valmir era alimentado. Então separaram os gêmeos das salas, pois ele precisaria de mais atenção.
Duas visitas de 30 minutos cada, por dia; algumas fraldas para forrar suas caminhas na encubadora, leite para o Valmirzinho, orações e amor, muito amor era o que eu e o pai podíamos dar a eles...Eram momentos mágicos quando podia tocar em seus pequenos corpinhos e dar a eles um pouco de carinho.
Foi uma festa quando fez seu primeiro xixi; inclusive para a enfermeira que cuidava dele - Tia Flávia, esta foi tão mãe para ele quanto eu nos dias em que lá permaneceu.
Víctor(dei a ele o nome do meu avô, que não conheci) veio a falecer dia 23/5(enquanto tentava assistir aula na faculdade , para ver se conseguia forças para enfrentar aqueles dias tão duros).
Só pude pegá-lo no colo neste dia, devido aos tubos para respiração e "alguns fios" em braços e pernas com diuréticos, vitaminas essenciais , drogas que ajudam na coagulação, etc.
Houve dias em que sangrava pela pele... era como um peixinho fora d'água! Levei seu corpinho até a sala onde estava seu irmão para se despedir- o Valmir sentiu nossa presença e sua saturação caiu. Lembro-me da cara de espanto da enfermeira naquele momento.
Dia 5/5 a 13/6: meu outro filho, Valmir(o mesmo nome do pai) permaneceu internado na UTI. Era maior que o Víctor(que nasceu com 630 gramas) , pesava 1.320Kg quando nasceu. Sua permanência de mais de um mês nos respiradores desenvolveram fungos e bactérias, e assim uma pneumonia tomava conta dele . Era um bebezão nestes dias: já pesava 1.800Kg mais ou menos(dia 7/6 pude pegá-lo em minhas mãos dentro da encubadora- foi uma emoção sem valor igual) , mas isso não era o bastante para salvá-lo. A prematuridade de seus pulmões não colaborou.
Valmir veio a falecer dia 13/06, em meio as nossas lágrimas e as da sua " outra mãe", a enfermeira Francisca, pudemos pegá-lo no colo, para nos despedirmos.
No hospital, conheci pessoas muito especiais, muitos que talvez nunca mais verei, mas que estarão sempre na lembrança.
Em casa ficaram um quarto do ursinho e do tigrão todo azul; roupas , fraldas, brinquedos, presentes dos que os esperavam conosco, suas fotinhas(que tirei escondido , pois é proibido na UTI), "muita coisa material" da qual uma criança deve ter, mas que não é tão importante quanto ao amor e carinho que deve receber desde o conhecimento da existência de vida dentro do ventre de sua mãe...
Restaram também dois colos vazios e uma irmãzinha que só os conheceu na hora da despedida...
A saudade corrói aos poucos, mas nada me tira o direito e o dever de continuar sonhando.
Afinal, devo fazer valer suas vindas tão breves aqui na terra, pois foram Duas vidas que "nasceram antes ", para que uma sobrevivesse-
Assim, Deus sabe o que faz e só dá à nós o que precisamos, como costumam dizer, -- a "carga" que cada um pode aguentar.
-Pedi um dos filhos do Papai do Céu, mas Ele me deu dois!!- e mesmo que os tenha levado devolta, tenho orgulho de ter sido M-Ã-E de pessoinhas tão fortes e que me ensinaram tantas coisas em tão pouco tempo!!!!!!!!
Muito obrigado a meus anjinhos Valmir e Víctor
E ao "Papai do Céu"...